De estátua à carne e osso: nenhuma mulher está a salvo
- Solteirice em Estudo

- há 1 hora
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De estátua à carne e osso: nenhuma mulher está a salvo.
Estamos em 2025 e é difícil aceitar que ainda precisamos de um movimento global para conscientizar e mobilizar em prol do fim da violência contra mulheres. Porém, a realidade é cruel e infelizmente estamos longe de termos controle sobre os nossos próprios corpos. Essa semana dois episódios que vi na internet me chamaram atenção e me fizeram refletir: Será que um dia nós, mulheres, estaremos seguras? Quem tem direito à estar seguro?
O instagram Mídia Ninja em collab com Planeta Ella, publicaram um vídeo de uma escultura em bronze, chamada de Molly Malone, que fica em Dublin, Irlanda. O vídeo é de embrulhar o estômago! A estátua foi criada em 1988, e em algum momento surgiu que tocar nos seios de Molly proporcionará sorte.
No vídeo, a primeira coisa que vejo é que esse local está visivelmente desgastado. E na sequência, imagens de homens tocando de formas agressivas e sexuais são exibidas. Eles colocam uma mão, as mãos, a boca, agarram por trás enquanto encostam nos seios de Molly. Esses homens jovens ou mais velhos fazem isso com um sorriso escancarado no rosto, fazem isso individualmente e também em grupo. O ato em si é uma mensagem. O ato acompanhado de sorriso ressalta a mensagem. O ato, acompanhado de sorriso e em grupo, sublinha a mensagem : o corpo de uma mulher não é dela, e sim , objeto de desejo e propriedade de um homem, seja ele quem for.
E junto com a mensagem, vem um lembrete: homens podem agir de tal modo em público, em plena luz do dia e vão seguir sendo protegidos. Homens protegem homens. O machismo estrutural e a cultura do estupro validam essa barbárie.
Em contraponto, no vídeo, as mulheres lutam. Lutam por Molly, por si e por tantas outras. Malone, é abraçada por mulheres como forma de apoio, sua mão é tocada por mulheres e nesse toque vemos também uma mensagem : entendo o que você passa, te acolho, te dou a mão e vamos seguir juntas. Como símbolo, uma visitante deixa flores na cesta que compõe como elemento cênico da estátua.
Vale ressaltar, que não há comprovação que Molly tenha sido uma pessoa real, e por isso, é possível considerá-lá uma personagem do folclore Irlandês. Uma estátua, ou podemos dizer, um objeto inanimado, é violentada e objetificada. Agora vamos pensar, e uma mulher viva? E uma idosa viva? E uma criança viva? E uma bebê viva? São igualmente violentadas, objetificadas e correm grandes riscos de serem mortas. E após essas mulheres serem mortas? Preciso falar? Nem um cadáver feminino está a salvo. Ser mulher é sobreviver todos os dias, visto que as violências podem acontecer a qualquer hora, em qualquer lugar e podem ser praticadas por qualquer homem.
Enquanto isso no Brasil, sendo mais específica, em Salvador, uma mulher é assediada e importunada sexualmente pelo personal trainer dentro da academia. A vítima, ou melhor, a sobrevivente, relata de forma objetiva o progresso das violências. Em um trecho, ela relata que criminoso “lateralizou minha calcinha e fez movimentos …” e que na sequência ele colocou a mão dela no órgão genital dele e falou “Olha como eu fico com você”. Quando soube, a primeira coisa que me passou a cabeça e deixo aqui registrado é que sinto muito pela vítima, ela tem meu apoio. Saber de uma violência dói, porque me lembra o horror que é, e me faz refletir que dessa vez foi com ela e amanhã pode ser comigo, com minha amiga, minha vizinha, alguém da minha família.
A repulsa aumenta quando vejo que a matéria circula por alguns jornais e perfis do instagram. Me deparo com uma chuva de mensagens de homens defendendo o personal e duvidando da denúncia da vítima em comentários como : “Só gostaria de saber o porquê dela não ter procurado uma autoridade policial na época, já que ocorreu 2x” , “ Força Personal… estamos todos com você” , “ Tem que investigar isso direitinho aí viu, algo não está batendo! Se comprovado que ele pague pelo que fez, mas julgar sem provas é complicado, e é o que a internet mais fazem” , “ falar é fácil, difícil é provar.” , “ Hoje é muito fácil destruir a reputação de alguém. Expor a pessoa assim, sem ter sido julgado, sem que haja provas, é uma irresponsabilidade de consequências por vezes irremediáveis. Denúncia tem de ter prova. Essa irresponsabilidade de dar valor de prova a alegações da suposta vítima viola completamente as garantias fundamentais e o próprio marco civilizatório.”
Sim, assim como você, eu fico enojada ao ler essas falas. Discursos como esses fazem que o silêncio das vítimas seja maior do que a quantidade de denúncias. É preciso muita coragem para denunciar, porque a revitimização não é uma possibilidade, é uma certeza. Após a denúncia, novas vítimas procuraram a cliente da academia que conta que hoje mais de 40 mulheres já entraram em contato compartilhando casos semelhantes que vivenciaram com o mesmo personal entre o período de 2023 até 2025. Incluindo vítima que relatou até que o crime chegou à ejaculação.
Quantas mulheres estão ao nosso lado e não sabemos que elas são vítimas de violência sexual? O que é preciso para termos dignidade e direitos garantidos? Quantos homens conhecem um assediador? Um estuprador? Um feminicida? De acordo com um seguidor, “não é possível que nenhuma dessas mulheres tenha um irmão homem ou um pai homem de honra”. E para finalizar, respondo esse comentário: mulheres não precisam de outros “homens de honra” para serem respeitadas, protegidas e validadas. Mulheres tem direitos fundamentais garantidos (agora faltam os “homens sem honra” e “homens de honra” aceitarem isso!).
Por: Marina Paiva
Referências:
Perfis do instagram:
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